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A desconfiança corporativa dos advogados

A desconfiança corporativa dos advogados

O desenvolvimento do trabalho voluntário, no Brasil - o que atualmente recebe a designação de terceiro setor - vai adquirindo a importância que já possui nas Democracias civilizadas do mundo contemporâneo, o que é reflexo de uma evolução da consciência social, talvez um dos marcos positivos deste início de milênio. Empresas e profissionais liberais organizam mutirões de assistência e, levando centenas de voluntários a participar de reformas de escolas, de creches, de hospitais, de asilos e abrigos de carentes, às vezes em poucas horas de trabalho conjunto têm obtido resultados, de fato, surpreendentes. Qualquer médico que resolva, por idealismo, dedicar algumas horas de trabalho em favor de doentes necessitados de atendimento e com poucos recursos para tratar-se, com certeza terá plena liberdade de fazê-lo e será muito bem-vindo, se o fizer. Qualquer dentista que, por um sentimento de solidariedade, em relação aos sofrimentos do próximo, resolva dedicar parte de seu tempo útil ao cuidado dos dentes de pessoas carentes, certamente encontrará o caminho aberto para sua prática benfazeja. Qualquer engenheiro ou arquiteto que, sensibilizado com a falta de moradia dos pobres, decida dar sua contribuição profissional, sem cobrar, para os mutirões de construção de moradias populares, estará inteiramente livre para essa boa ação. Mas qualquer advogado que resolva ajudar, gratuitamente, pessoas necessitadas de assistência jurídica - e isso não se restringe aos presos - correrá o risco de sofrer processo e ser condenado pelo Tribunal de Ética de sua entidade de representação profissional, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Quer dizer, ao contrário do que ocorre com todas as demais atividades, em qualquer parte do mundo civilizado, no Brasil o advogado que pratica (ou comete?) trabalho voluntário é, presumidamente, antiético! Pretendendo resolver o "impasse" entre a proibição do trabalho gratuito, estabelecida em seu Código de Ética, e o direito de seus profissionais realizarem - como quaisquer outros - trabalho voluntário, o bem-intencionado presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da seccional paulista da OAB, Jorge Eluf Neto, ultimou uma proposta de regulamentação da chamada advocacia pro bono, destinada a permitir essa assistência voluntária apenas às entidades, instituições ou organizações não-governamentais (ONGs) que prestam serviços à comunidade - mantendo assim a proibição, aos advogados, da assistência jurídica gratuita (e direta) às pessoas físicas. Antes o Centro de Estudos das Sociedades dos Advogados (Cesa) já propusera a solução do "impasse" da seguinte forma: criação de um "banco de horas", por meio do qual 450 escritórios de advocacia (membros do Cesa) disponibilizariam um determinado número de horas para a advocacia gratuita. Quando recebessem solicitação, por parte de pessoas carentes ou de entidades de assistência social, esses escritórios descontariam do banco de horas o trabalho que oferecessem. Agora se indague: por que tudo isso? Que motivos haveria para se restringir um ato de vontade - socialmente benéfico e moralmente meritório - assim como um legítimo direito de atuação de um qualificado profissional do Direito, em benefício do próximo? A resposta está na explicação dos que se esforçam para resolver o tal "impasse". O presidente do Tribunal de Ética da OAB paulista explica que sua proposta visa a evitar o "desvio de conduta", que é "a captação de clientela" - tanto que por ela os advogados serão proibidos de prestar assessoria jurídica a fundadores e mantenedores das entidades (que poderiam beneficiar-se da advocacia pro bono). Um advogado ligado ao Cesa explica: "O Cesa seria um filtro eficiente para afastar possíveis práticas de concorrência desleal e captação de clientela." Percebe-se, então, que dentro da categoria dos advogados o maior receio que existe é quanto à "captação de clientela" por meio da "concorrência desleal". Apesar de existir um s