Nosso Conteúdo

Artigos

Voltar

Por que dobram as caçarolas?

por Carlos Alberto Montaner em 5/24/2021

A crise argentina custará US$ 10 bilhões às empresas espanholas. E outro tanto às norte-americanas. Talvez um pouco menos. Mas as mais prejudicadas, com certeza, serão as argentinas. Todas elas - dezenas de milhares - verão reduzir-se o valor de seus ativos, perderão vendas em meio à recessão e, provavelmente, terão de enfrentar um período de inflação que levará muitas delas à falência. Naturalmente, essas perdas se refletirão no modo de vida dos argentinos. Ficarão mais pobres. O salário que receberão terá menor poder aquisitivo e eles poderão adquirir menos bens e serviços.

Assim são as crises. Agora vem o período de apontar os culpados. Os mais evidentes, é claro, são os políticos. Com algumas exceções, eles foram corruptos, imprevidentes e incompetentes. Gastaram muito mais do que recomendava a prudência, transformando as instituições públicas em agências de empregos destinadas a mantê-los no poder. Pura "corrupção de baixa intensidade", como chamam hoje o velho clientelismo. Mas esses políticos não são pessoas estranhas ao povo argentino. Ao contrário: foram eleitos porque fazem parte da sociedade. Os argentinos se reconhecem neles e eles, os políticos, são os grandes peritos em argentinos. Os políticos não são senão uma expressão do povo de onde saíram, e se comportam de acordo com os valores, usos, costumes e crenças que prevalecem no seu meio. Não formam uma raça à parte nem são diferentes dos farmacêuticos ou dos professores de violino.

Aonde essa afirmação nos leva? Ao fato de que o núcleo do problema está nos valores, usos, costumes e crenças que prevalecem na Argentina ou em qualquer outro povo. Por que os políticos argentinos, bem como os de quase toda a América Latina, roubam? Porque roubar não desqualifica moralmente, quase nunca se persegue pela via judicial e nem sequer tem um custo eleitoral.

Perón, que no seu primeiro período de governo demonstrou que era desonesto e incompetente, foi eleito outras duas vezes, e em nenhum dos casos obteve menos de 60% dos votos. É verdade que os políticos argentinos empregaram, irresponsavelmente, um exécito de funcionários públicos. Mas é possível, em nossos países, alguém ser eleito propondo um programa de austeridade, contratação por méritos e estrita sujeição às normas? Onde está o poder de um governante que não pode beneficiar o amigalhaço com uma licitação fraudulenta, colocar sua queridinha num cargo bem remunerado ou acelerar na direção favorável os trâmites do processo de alguém que esteja paralisado pelo marasmo burocrático? É possível fazer negócios, grandes ou médios, na América Latina, sem antes "engraxar" a máquina governamental com subornos?

Não são cúmplices desse lamentável fenômeno os empresários que hoje reclamam do descalabro econômico, mas ontem se prestaram a participar do delito de conluio, convencidos de que essa é a única maneira de fazer negócios na América Latina?

O mal está enquistado em nossa cultura. A quebra atual da Argentina é puramente anedótica. É possível encontrar dez causas diretas e imediatas para explicar este episódio recente, mas o problema de fundo vem de longe.

Quando o povo, desesperado, sai às ruas batendo caçarolas, quando arruaceiros queimam pneus e ladrões assaltam supermercados - é bom dar a cada grupo o nome que merece -, estão protestando em vão. Não resolverão nada de maneira definitiva apelando para esses procedimentos. Dentro de cinco ou dez anos, uma crise parecida derrubará novamente o que se tiver conseguido reconstruir.

Se esta análise for correta, quem quiser contribuir para a solução dos males mais graves da Argentina (e de toda a América Latina) tem de chegar à raiz.

Deverá concentrar seus esforços na modificação dos aspectos negativos que provocam nossas crises periódicas. Terá de trabalhar no âmbito dos valores, usos, costumes e crenças. E de atuar no âmbito da cultura. Como? Divulgando informações, educando, denunci Autor(es)

Carlos Alberto Montaner