Nosso Conteúdo

Entrevistas

Voltar

Diplomacia para demônios iniciados com Rubens Ricupero.

Diplomacia para demônios iniciados

Rubens Ricupero, 68 anos, não espera que lhe perguntem. Vai logo avisando: política, não mais. Diplomacia, já foi além do planejado. Agora quer lecionar, escrever e curtir São Paulo, a terra natal de onde saiu rapazola para fazer o curso Rio Branco, ingressar no Itamaraty e iniciar uma geografia pessoal que o fez viver em muitos lugares do mundo. Mas quem acredita que o embaixador, ex-ministro da Fazenda de Itamar Franco e por nove anos secretário-geral da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) vai mesmo se restringir a uma sala de aula ou se entregar à solidão da produção literária?

        Na semana passada, quando a Europa viveu dias de fervura com a rejeição da Constituição européia em dois referendos importantes - o da França e o da Holanda -, Ricupero analisou o "não" que proliferou nas urnas e as repercussões disso no tabuleiro global. Esse foi o desafio que lhe foi proposto, na forma desta entrevista, pelo caderno Aliás.

        As reflexões que foram surgindo denotam intimidade com a diplomacia. Ricupero acha que o resultado dos referendos não representa um golpe fatal na idéia de integração européia, mas admite que o processo de unificação, que vinha em ritmo acelerado, agora ganhou travas. Apela para analogias ao explicar as dobraduras da política internacional. Diz, por exemplo, que a Europa é um velho diabo experiente, capaz de conter o diabo americano, "mais jovem e com impaciências". Ao explicar que ainda não se desenhou uma visão única de continente - até porque existem os que sonham com o modelo liberal e os que preferem o modelo social -, apela para uma comparação inesperada. Argumenta que, como em muitos casamentos, os europeus dormem na mesma cama, mas sonham diferente.

        E o que o Brasil tem a ver com isso? Tudo. Ricupero então avança pelos caminhos do Mercosul, fala do impasse da Alca, destaca prós e contras da política externa brasileira. Salomônico, tem elogios e reparos tanto para Fernando Henrique quanto para Lula. Assim como para os "Celsos" - Lafer e Amorim, respectivamente os chanceleres do presidente tucano e do petista. Assim se aloja no posto de observador independente. Às voltas com a mudança de Genebra para São Paulo, o que Ricupero quer decifrar é a confusão urbana que deteriorou a região do Gasômetro, no Brás, reduto de italianos onde nasceu. "E não é que eu ia da minha casa até a catedral a pé, passeando?" Agora ficou difícil, embaixador.

O Estado de São Paulo, 05 de junho de 2005 Autor(es)

Rubens Ricupero.