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Perdão e seus novos conceitos - Apresentação

Perdão e seus novos conceitos - Apresentação

Autor: Carlos Aurélio Mota de Souza | Editora: UNIVEM | Data: 4/26/2021

APRESENTAÇÃO

Perdoar é tema pertinente a estes tempos de injustiças, conflitos familiares, sociais e entre os povos. O perdão expressa a superioridade moral do agir humano, é prática de justiça na sociedade e perante os tribunais, e é garantia de pacificação, fundado nas categorias da fraternidade e da misericórdia. Perdoar pessoalmente o próximo, ou diante de juízes, apaga a violência praticada, restaura as relações pessoais e restabelece a paz social; objeto maior da justiça, a virtude humana por excelência, louvada pelos filósofos antigos, pelo ensino de São Tomás de Aquino e pela doutrina social da Igreja. Entretanto, filósofos contemporâneos nihilistas, de tradição nietzschiana, se ocuparam em descontruir muitas das categorias herdadas do humanismo clássico e do pensamento cristão, como a regra de ouro amar ao próximo como a si mesmo. Mas, a própria desconstrução acaba por dar sinais de esgotamento, retomando a necessidade de se pensar categorias centrais do humanismo clássico e, sobretudo, do pensamento cristão, tais como o perdão e a misericórdia. Vemos isso ocorrer no pensamento de Jacques Derrida e Paul Ricoeur, sobre questões já pensadas por Hannah Arendt, como foi amplamente analisado nos ensaios desta obra. As relações humanas não podem subsistir simplesmente por “força da lei”, pois, se não houver um espaço dentro da lei para o perdão, a alteridade desaparece. Para Arendt, “[…] nenhuma sociedade subsiste sem o perdão”. Na categoria do humano, é preciso atribuir-se a categoria da falibilidade; ou seja, que somos falíveis, erramos mesmo sabendo o que é certo e, se não podemos contar com o perdão do outro, e ao mesmo tempo não dermos o perdão, o caminho sem volta é o isolamento e a impossibilidade das relações. É São Paulo quem confessa: Não faço o bem que quereria, mas o mal que não quero (Romanos 7,19). Lembremos que, para perdoar, devemos ter a humildade de que podemos amar e também precisamos de perdão; às vezes, o perdão é uma atitude positiva, no sentido de correção fraterna, e não de indiferença. A lei escrita mais antiga da humanidade, a Lei de Talião, era expressa pela máxima olho por olho, dente por dente, em rigorosa reciprocidade do crime e da pena. Porém, Cristo mandou perdoar não sete, mas setenta vezes sete (Mateus 18,32). Do ponto de vista da lei, o perdão está vinculado à equidade e à misericórdia. Abre-se esta coletânea com as considerações sobre “A problemática do Perdão”, de autoria do homenageado, com quem privamos no Curso de Graduação desta egrégia Instituição. Suas análises sobre o tema abrangem aspectos multidisciplinares, desde as ofensas pessoais que devem ser perdoadas, às graves e hediondas crises mundiais, não só pelas guerras, mas contra os direitos humanos, e a mais grave, no século XX, foi o drama do Holocausto. Jacques Derrida e Paul Ricoeur analisaram, filosoficamente, tais fenômenos, mas, em torno da insuperável obra de Hannah Arendt, de origem judaica, que se dedicou a estudar o acontecimento. Além de A condição humana, destaca-se o trabalho Eichmann em Jerusalém, a cujo julgamento assistiu pessoalmente para lançar o subtítulo Um relato sobre a banalidade do mal, afirmando que o perdão não tem apenas dimensão moral e religiosa, mas também política. Mário Coraini Júnior sintetizou, com acuidade, as aplicações do perdão aos diversos tipos de ofensas, em seus aspectos ético, jurídico, político, teológico e terapêutico. São exaustivas suas referências à obrigação moral de perdoar, como gratidão, cortesia, solidariedade, urbanidade, sendo juridicamente relevantes o perdão judicial, a anistia, a graça e o indulto. Os ensaios apresentados pelos autores, sobre mediação, conciliação, arbitragem e justiça, indicam uma revolução paradigmática das decisões judiciais, e suscitarão, certamente, novos estudos sobre modalidades de solução de litígios, eticamente superiores aos métodos tradicionais. É merecida a homenagem ao ilustre Professor, portador de longo currículo acadêmico, neste 50º Aniversário da Fundação de Ensino Eurípides Soares da Rocha, Mantenedora o Centro Universitário UNIVEM.

Carlos Aurélio Mota de Souza Professor na Graduação em Direito da Fundação Eurípedes (1972-1978) e no Mestrado em Direito (2003-2005).