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Poderes Éticos do Juiz

Poderes Éticos do Juiz

Autor: Carlos Aurélio Mota de Souza | Editora: Sérgio Antonio Fabris Editor | Data: 4/22/2021

Primeira Edição - Ano de 1987

1987 - Poderes Éticos do Juiz

INTRODUÇÃO

O Código de Processo Civil de 1973 ampliou largamente o número de regras éticas sobre a conduta das partes e das diversas pessoas que atuam no processo, quer procuradores, auxiliares permanentes da justiça (serventuários, oficiais de justiça), ou auxiliares eventuais (peritos, testemunhas, intérpretes, depositários, administradores), quer os próprios representantes do Ministério Público, da Fazenda ou da Magistratura. Desde sua vigência, os Tribunais vêm se pronunciando sobre as mais diversas situações processuais, em que se impõe a aplicação de sanções imediatas para coibir o abuso de direito, a má-fé, a deslealdade, o dano processual, havendo aspectos controvertidos ou pouco estudados, após um decênio de sua edição. Qual a razão filosófica e a finalidade jurídica dessas sanções são indagações objeto de estudos tão antigos quão profundos, não só no Brasil como entre doutrinadores alienígenas, notadamente italianos. Colocam-se entre nós, v.g., Jorge Americano (Do abuso do direito no exercício da demanda, 1923); Pedro Baptista Martins (O abuso do direito e o ato ilícito, 1941); Jonatas Milhomens (Da presunção de boa-fé no pro¬cesso civil, 1961); Everardo Cunha Luna (Abuso de direito, 1959); José Olímpio de Castro Filho (Abuso do direito no processo civil, 1960), e recentemente, com enfoque sobre o novo Código, Alcides Mendonça Lima (Proibidade processual e finalidade do processo, 1978); José de Moura Rocha (As sanções no processo civil, in Estudos sobre processo civil, vol. II, 1982); José Carlos Barbosa Moreira (A responsabilidade das partes por dano processual, in Temas de direito processual, 1977); Yussef Said Cahali (Responsabilidade do litigante temerário pelo dano processual, 1977). Dentre os estrangeiros são exaustivos os trabalhos de Gino Zani (La mala fede nel processo civile, Roma, 1931); Kaethe Grossmann (O dever de veracidade no processo civil, Rev. For., 101/279); René Savatier (Traité de la responsabilité civile en droit français civil, administratif, professionnel, procédural, Paris, 1951); Piero Calamandrei (II processo come giuoco, Pá-dua, 1950); René Japiot (Des sanctions en matiére de procédure, 1914); Guido Calógero (Probità, lealtà, veridicità nel processo civile, 1939); Eduar-do J. Couture (El deber de decir la verdad en juicio civil, 1938; Oralidade e regra moral no processo civil, Rev. For., 77/21); Walter Zeiss(Eldolopro-cesal, 1979); Manlio la Rocca (Profili di un sistema di responsabilità proces-suale, 1969), etc. Concebido o processo, modernamente, como instrumento estatal de composição de litígios particulares, de um lado se exige a iniciativa dos demandantes, como poder e faculdade, e, de outro, se impõe o constante impulso pelos órgãos jurisdicionais, como poder e dever do Estado. Incumbe, aos primeiros, como deveres e ónus processuais, pleitear de boa-fé, não praticando abuso do direito de demandar e procedendo com probidade, lealdade e veracidade, não só perante a parte contrária e os demais operadores do processo, mas, sobretudo, diante do Juiz, preservando sempre a dignidade da Justiça. E aos segundos, a responsabilidade funcional de bem administrar o processo, assegurando a real igualdade das partes, a celeridade e economia e reprimindo toda espécie de abuso processual, a fim de que o processo alcance seus últimos fins, resolvendo o litígio, resguardando o ordenamento jurídico e restabelecendo a paz social. Pretende-se demonstrar, neste trabalho, que, a par de regras éticas explícitas acolhidas pela legislação processual, outras existem, implícitas, que permitem outros tantos poderes ao Juiz. Através de interpretação mais ampla da atuação judicial, tais ditames vêm a se constituir em DEVERES DO JUIZ; e para maior garantia de suas funções, o novo Código lhe outorgou poderes excepcionais, jamais encontrados em qualquer outra legislação, através de um amplo sistema de sanções processuais, as quais, bem conhecidas e aplicadas, se constituem em eficazes instrumentos de tutela de toda atividade processual. O tema é amplo e comporta longa meditação, sob o enfoque da Teoria Geral do Processo, carecendo-se ainda de um estudo sistemático e abrangente dos poderes ético-jurídicos do Juiz, das formas de abuso e dano no processo e das sanções processuais.